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Como dialogar sobre aborto na política?

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Como promover um diálogo saudável e respeitoso sobre direitos coletivos em uma sociedade formada por diferentes crenças e valores? Nos juntamos entre várias organizações para apoiar candidaturas e mandatos com esta trilha de aprendizagem acessível com informações, referências e narrativas sobre aborto e justiça reprodutiva no  Brasil e na América Latina.

Setembro 13, 2024. Por Im.pulsa

Política e aborto na América Latina

Da Irlanda ao Nepal, o direito ao aborto está sendo reconhecido como um direito humano fundamental. Nos últimos trinta anos, sessenta países em todo o mundo legalizaram o aborto, segundo levantamento do Center for Reproductive Rights. 

A América Latina, apesar de ser uma das regiões mais restritivas neste tema, vive uma maré verde, com legalizações no Uruguai, Argentina, Colômbia e México.

No entanto, países como El Salvador, Honduras, Haiti, Nicarágua e República Dominicana, ainda proíbem totalmente o procedimento. Do mesmo modo que países que viram avanços nesse tema se deparam com ameaças de retrocesso, como ocorre hoje na Argentina com o novo governo da ultradireita de Javier Milei.

No mapa abaixo é possível observar quais países da região permitem o aborto, com limites relativos à idade gestacional (tempo de gravidez), para preservação da vida e da saúde física e mental das gestantes, e em quais países a interrupção da gravidez é totalmente proibida.

Nos países que permitem aborto para preservar a vida da pessoa gestante, também temos legislações adicionais, como é o caso do Brasil, Chile e Panamá que permitem aborto em casos de violação sexual. Também há outros casos especificados em lei nestes países.

Já nos países que permitem para preservar a saúde da pessoas gestante, temos casos como o da Bolívia que falam explicitamente de preservar a saúde mental.

Confira o mapa global iterativo aqui (em espanhol).

Criança não é mãe, um desafio latino-americano.

Você já imaginou 21 estádios do Maracanã lotados de meninas e adolescentes grávidas? Essa é a realidade da América Latina e do Caribe.

Segundo publicação da UNFPA, agência das Nações Unidas para a saúde sexual e reprodutiva, na América Latina e no Caribe são relatados mais de 1.600.000 nascimentos de meninas e adolescentes entre 10 e 19 anos de idade por ano, o equivalente a 21 estádios do Maracanã lotados.

Do total anual de nascimentos em que as parturientes são  meninas e adolescentes, 36 mil desses casos são de meninas menores de 15 anos, o que equivale a 4 meninas que se tornam mães a cada minuto, em nossa região.

Segundo relatório da Organização Panamericana de Saúde (OPAS, 2018), a América Latina é a segunda região do mundo com maior prevalência de maternidade infantil.

Enquanto nossas meninas e adolescentes vivem essa realidade, parlamentares brasileiros (veja aqui a lista),tentaram aprovar um projeto de lei que vulnerabiliza ainda mais os seus direitos, limitando a idade gestacional para o abortamento legal em 22 semanas, com penas maiores que as de seus violadores.

No Brasil, o estupro é uma das três situações em que a interrupção da gravidez é permitida, em conjunto com o risco de morte de quem gesta e a anencefalia fetal. Nesses casos, não há previsão de limite de idade gestacional para o procedimento, que deve ser ofertado pelo SUS em serviços especializados e/ou credenciados.

“Mesmo em serviços credenciados para realizar o procedimento, tem-se a dificuldade de os profissionais médicos aceitarem realizar por objeção de consciência, ainda que o estabelecimento de saúde, uma vez cadastrado, deva garantir a existência de profissionais que o façam. Dessa forma, a proposta trazida pelo PL 1904, de limitar a idade gestacional para o abortamento legal em 22 semanas, limita o acesso a esse direito, na medida em que a identificação da gravidez em vários casos é demorada”. – Posicionamento oficial da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Leia na íntegra aqui.

Em uma enquete realizada pelo site da Câmara dos Deputados, 88% da cidadania opinou discordar totalmente do projeto,com 978.075 participações.  

Com a pressão da sociedade civil e de mulheres políticas de diferentes setores, a proposta não avançou e aguarda o despacho do Presidente da Câmara dos Deputados, podendo ainda entrar em votação. 

Estratégia Argentina e a Maré Verde

Foto: Eleitas, Instituto Update

A Maré Verde é um movimento de mulheres de diversos países da região, que começou na Argentina, pela legalização do aborto. 

O movimento é marcado pelo uso de lenços verdes e por estratégias integradas, como a ocupação das ruas, escolas, sindicatos, passando pelo ativismo por educação sexual integral e pelo lobbying parlamentar.

A Campanha Nacional Pelo Direito ao Aborto Legal, Seguro e Gratuito foi uma luta de 17 anos das mulheres argentinas, que demandou o reconhecimento de direitos reprodutivos e sexuais. 

Em 2020, o aborto foi legalizado na Argentina, colocando fim à lei de 1921 que criminalizava o aborto – exceto em casos de estupro e risco de vida para a gestante.

Judicialização no México e na Colômbia

Em 2021, a Suprema Corte de Justiça da Nação (SCJN) considerou a penalização do aborto inscostitucional no México. A decisão ordenou que nenhuma mulher poderia ser presa por realizar um aborto e que juízas e juízes deveriam encerrar os processos criminais contra elas.

Mas foi em 2023, que o México deu um passo mais concreto pelos direitos das mulheres. Por unanimidade, a SCJN passou a obrigar as instituições federais de saúde pública a oferecer o serviço de interrupção da gravidez gratuitamente. Além disso, a resolução do Tribunal indica que em nenhum caso profissionais médicos poderão ser criminalizadas.

No mesmo caminho e estratégia de judicialização, uma coalizão de organizações colombianas se juntaram no movimento Causa Justa para demandar o direito ao aborto à Corte Constitucional do país.

Em 21 de fevereiro de 2022, a decisão da Corte ampliou o direito ao aborto, permitindo a interrupção da gravidez em 2 casos:

 

  1. em qualquer momento e sob demanda da pessoa gestante, antes dos 6 meses de gravidez
  2. em qualquer momento da gravidez, uma vez cumpridas as causas legais determinadas pela Corte Constitucional desde 2006:
  • Quando a continuação da gravidez constituir um perigo para a vida ou para a saúde geral da gestante.
  • Quando há malformação fetal, tornando inviável a vida fora do útero.
  • Quando a gravidez é produto de estupro ou incesto.

Mas a judicialização não foi a única estratégia utilizada pelas colombianas. Parte da estratégia passou também pela mudança da opinião pública, inspirando-se no movimento argentino: com campanhas nas redes sociais, em rádios e articulando celebridades e influenciadoras.

Noventa argumentos pela despenalização total do aborto foram divulgados por “La Mesa por la Vida y la Salud de las Mujeres”. Entre eles, dados como “61% da população afirmou discordar que as mulheres devem ir para a cadeia por interromperem a gravidez voluntariamente”.

“As ativistas feministas na América Latina se apoiam cada vez mais umas nas outras para desenhar a estratégia jurídica, as táticas de organização e inspiração”. – Julie Turkewitz, New York Times

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Esta guia foi escrita por Dany Fioravanti, Coordenadora da Im.pulsa e Gerente de Comunicação do Instituto Update.

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O Instituto Update é uma organização da sociedade civial que trabalha para o fortalecimento de iniciativas e práticas inovadoras que nascem da imaginação política das mulheres jovens, populares, negras, indígenas e LBTQIA+ na América Latina. Seu propósito é que os sistemas políticos sejam mais participativos, representativos e populares, aproximando mais lideranças e seus territórios da política institucional.

 

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Referências:

Im.pulsa

Plataforma aberta e gratuita para inspirar, treinar e conectar mulheres, auxiliando-as a superar desafios políticos e produzir campanhas vencedoras. Oferece formação política para mulheres por meio de produtos práticos com linguagem acessível e afetiva. A Im.pulsa é feita por e para mulheres.